"Há gente que, em vez de destruir, constrói; em lugar de invejar, presenteia; em vez de envenenar, embeleza; em lugar de dilacerar, reúne e agrega." Lya Luft
Algumas pessoas têm o dom de
destruir aquilo que, no íntimo, querem valorizar. Outras se esforçam para
supervalorizar aquilo que, no íntimo, sabem que deve ser destruído. Não é raro
essas duas características coexistirem harmonicamente na mesma pessoa. Até
mesmo porque destruir o que deve ser valorizado é uma inteligente e
maquiavélica forma de supervalorizar o que deveria ser destruído. Contudo, hoje
vou me propor a falar apenas do primeiro tipo.
Pessoas assim são como
aquela mãe que come silenciosamente o delicioso bolo surpresa que a filha preparou,
mas só faz criticar a bagunça que foi deixada na cozinha. E, por causa da
bagunça, destrói a bela iniciativa da filha – que, no fundo, obteve admiração
velada da mãe, mas só recebeu de concreto a sua raiva. Bagunça esta, vale a
pena dizer, que, na maioria das vezes, só existe mesmo na cabeça da própria
mãe. Afinal, não é nada fácil se deparar com uma pessoa que até anteontem estava
debaixo das suas asas, totalmente dependente do seu auxílio e orientação, e,
agora, começa a alçar voos próprios. Esses voos solos têm o poder de bagunçar as gaiolas por dentro: faz as “pessoas-gaiolas”
se sentirem ameaçadas, acuadas, destituídas de função e utilidade. Faz essas pessoas
sentirem que perderam o controle sobre a outra.
Esse dom de destruir o que
deve ser valorizado é a marca de uma mente ameaçada, de um coração inseguro de
perder o controle sobre algo que de fato já está voando livremente, sem
gaiolas, de forma leve e solta pelos ares.
Esses, os que realizam voos
solos, são criadores por natureza. Carregam a marca da excelência. E, para
criar, muitas vezes precisam, antes, destruir: desfazer barreiras, desconstruir
preconceitos, demolir muros de separação, pôr abaixo a inércia, dar a cara à
tapa. Traçar rumos antes jamais traçados e pisar em terras antes jamais
pisadas. Arregaçar as mãos. Fazer o novo ou, no mínimo, queimar alguns
neurônios para colocar a criatividade a serviço da renovação das antigas e boas
ideias que, de tempos em tempos, precisam ser renovadas para serem
compreendidas. São poucas as pessoas que se dispõem a esse árduo e desafiador
trabalho, por sempre envolver uma elevada dose de sacrifício e renúncia
pessoais.
Agora, para construir em
cima de edificação alheia, sempre aparece alguém sorrindo de orelha a orelha
com os dentes brilhando, disposto a destruir tudo que já foi construído, selado
e sedimentado após o árduo trabalho dos criadores. Esses, as “pessoas-gaiolas”
que se sentem ameaçadas, são os medíocres por natureza – como aquela mãe,
bagunçada internamente pelo delicioso bolo preparado pela filha. Não é à toa
que, em regra, a inveja é o alto preço que a excelência cobra da mediocridade.
O médico e professor de
psiquiatria Luís de Rivera define mediocridade como a incapacidade para
apreciar e valorizar a excelência. Segundo ele, na sociedade em que vivemos,
existe uma tensão latente entre excelência e mediocridade: enquanto aquela
contribui de forma definitiva para o progresso e para mudança, esta é
necessária para se manter inquebrável o status
quo e a estabilidade social.
Das três espécies de mediocridade
que o professor elenca, duas são simplesmente incapazes de reconhecer o
progresso, e uma – a pior e mais maligna delas – busca destruir o progresso
criativo, não importando os meios utilizados para se chegar a esse fim. É a
denominada mediocridade inoperante ativa, presente naquelas pessoas que não são
criativas nem produtivas, mas destrutivas, simplesmente por possuírem um enorme
desejo de serem notadas e mantidas em seu status
quo.
Afora todos esses dilemas
inerentes à sociedade doente na qual vivemos, gosto particularmente da forma
como Deus lida com “excelentes criadores” e com “medíocres destruidores”. Deus
ama tanto os que querem criar quanto os que querem destruir. Parafraseando
Lutero, Jesus não amou criadores e destruidores porque são dignos de serem
amados; mas, porque decidiu amá-los, criou neles o que vale a pena ser amado. E
mais do que amar: Deus usa os dois para sua obra aqui na Terra – apesar dos
dois. Até porque os “excelentes criadores”, após terem sua criação perfeita e
acabada, podem perfeitamente, depois de um tempo, se transformar em “medíocres
destruidores” apenas para manter inquebráveis o status quo conquistado e a
estabilidade pessoal adquirida. Jesus não. Jesus foi diferente.
O Excelente Criador nunca destrói
aquilo que quer valorizar. Pelo contrário, Cristo só destrói aquilo que
quer nos destruir e nos separar do seu amor. Jesus anulou a consequência do
orgulho que nos fez cair. Quer sejamos criadores, destruidores, ou os dois, através
da excelência da cruz Jesus destruiu o poder da morte e nos trouxe de volta pra
si. Não existem mais terrenos próprios ou alheios: tudo é de Cristo, por Cristo
e pra Cristo (Rm 11.36). Quem constrói o faz em terreno de Cristo. Quem destrói
o faz em terreno de Cristo. Chega de vaidade! Chega de excelência na mediocridade!
Chega de mediocridade na excelência! Valorize o que deve ser valorizado, para
honra e glória do único Criador de todas as coisas.
Por Fernando Khoury
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