:: O que os olhos não veem...o coração vê! ::
“O dia do Senhor virá como o ladrão de noite. Por isso, não durmamos como os demais, mas vigiemos, e sejamos sóbrios.”
(I Tessalonicences 5.2)

"E Jesus disse: Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que morra, viverá; e quem vive e crê em mim, não morrerá eternamente."
(João 11:25)

"Ainda que um arrependimento eterno manifeste-se depois desta vida, ele será inútil"
(Agostinho)

Acordei agitado no meio da madrugada. Meu corpo estava suado. Meu coração pulsava forte. A sensação era de que havia sonhado algo muito ruim. Meus olhos ainda estavam embaçados de sono. Um silêncio absoluto dominava o meu quarto, fazendo com que a única coisa que ouvisse fosse o meu próprio respirar ofegante. A noite, ainda escura, não me permitia enxergar os móveis com clareza. Mesmo assim, calmamente, levantei de minha cama e, quase caindo no chão de tanta fraqueza, andei cambaleando em direção à janela. Tudo que queria naquele momento era sentir a leve brisa do mar levar embora consigo todo aquele ambiente pesado. Coloquei meus braços sobre a janela e, como sempre, a empurrei contra a parede. Em vão: por alguma razão que eu não entendia, a janela não se abria. Não importava quanto esforço eu fizesse.

Não acreditando no que estava acontecendo, esfreguei meus olhos e, já um pouco mais acordado, concentrei toda minha força e tentei mais uma vez. Sem sucesso. Tudo muito estranho. Era como se uma força invisível impulsionasse a janela na direção oposta aos meus braços, conspirando contra mim a fim de não me deixar sentir no rosto o frescor de novos ares. Não teve jeito:
acabei por me sentir completamente sufocado pelo clima que envolvia aquele mesmo lugar que, na noite anterior, havia me proporcionado um sono tão leve e tranquilo.
Ainda não sabendo distinguir se era sonho ou realidade, comecei a ficar atormentado. O suor aumentou. O pulsar do coração também. Fiquei preocupado. Como a força das águas de uma cachoeira, um turbilhão de pensamentos começou a brotar em minha mente. Afinal de contas, o que estava acontecendo? Por que essa noite não era apenas mais uma noite comum como todas as outras? Qualquer tentativa de compreender racionalmente esse mistério que resolveu me afligir naquela noite me deixava ainda mais perplexo. Não conseguia entender nada, não conseguia ver nada...me senti pequeno demais, completamente perdido, no meio do caos. Nunca havia passado por uma situação tão estranha assim em toda minha vida.

Absolutamente transtornado, a única solução que me ocorreu para fugir daquele ambiente carregado foi abrir a porta. Ainda escuro, tive que ir tateando a parede delicadamente em sua direção. No trajeto, acabei por derrubar vários objetos e enfeites que caíam sobre os meus pés e se esfacelavam no chão, causando um barulho fino e estridente. O caminho até a porta nunca pareceu tão distante. Antes de conseguir chegar onde queria, senti os dedos de minha mão passarem por cima do interruptor de luz. Apertei instantaneamente. Pra minha surpresa, não ouvi o click, nem vi as luzes se acenderem. Apertei novamente, e nada! Muito diferente disso: a única coisa que percebi foi o barulho longínquo da chave virando e trancando a porta.

- "NÃO! A PORTA NÃO!", gritei angustiado. Naquele mesmo momento, comecei a tatear loucamente a parede procurando o mesmo interruptor para apertá-lo outra vez, na esperança de que a porta se destrancasse. Não encontrei nada. Misteriosamente, a parede havia ficado totalmente lisa.

Em meio àquela agitação que havia tomado conta de mim, já estava prestes a desistir de tudo, quando minhas mãos acabaram por esbarrar, sem querer, num objeto cônico de madeira. Mesmo sem conseguir enxergar, imaginei que pudesse ser a maçaneta. Como um peregrino desfalecido que encontra água fresca no deserto, me agarrei a ela com toda minha força, e não a soltei mais. Finalmente, havia encontrado um simples pedaço de madeira que, naquele momento, representava a minha única esperança viva e real de sair daquele lugar. Imediatamente, coloquei minha mão um pouco abaixo da maçaneta, com o objetivo de desvirar a chave e me ver livre daquela prisão em que meu quarto havia se transformado. Mas que chave? Só naquela hora fui me dar conta de que a porta do meu quarto jamais havia tido uma chave. JAMAIS! Novamente, uma infinidade de pensamentos começou a me consumir. Se nunca houve uma chave, o que fez a porta se trancar? E o barulho que eu havia ouvido quando apertei o interruptor, o que era?

Espantado, senti uma lágrima escorrer do meu olho esquerdo. Ela foi descendo lentamente pelo meu rosto e, passando pelo meu queixo, tocou sutilmente o chão. Neste exato momento, ouvi uma voz forte como um trovão, mas suave como o planar de uma pena, dizendo:

- "FECHE OS OLHOS. FECHE OS SEUS OLHOS PARA QUE VOCÊ POSSA VER".

Intuitivamente obedeci, porque havia sentido paz no tom daquela voz. Poucas coisas na minha vida haviam me proporcionado uma tranqüilidade tão profunda na alma quanto aquela voz. Fechei os meus olhos. No mesmo instante, ouvi o som da chave se desvirando, e um grunhido fino me revelou que a porta estava se abrindo.

- "NÃO ACREDITO!", pensei eu, ainda de olhos fechados. "FINALMENTE VOU ME VER LIVRE DESSE INFERNO".

Enquanto a porta foi se abrindo vagarosamente, senti um vento e um clarão muito intensos vindo em minha direção. Tentei abrir meus olhos para ver do que se tratava, mas não consegui: a mesma força invisível que havia me impedido de abrir a janela parecia estar sobre os meus olhos agora. A curiosidade tomou conta de mim. Continuei com os olhos fechados...mas, inexplicavelmente, comecei a visualizar, em imagens ainda disformes, o que estava do outro lado da porta. Aos poucos, tudo foi ficando nítido e no devido foco. Foi assim que, pela primeira vez, comecei a enxergar com os olhos do coração. Uma sensação totalmente nova e inebriante, como se estivesse aprendendo a mergulhar no fundo do mar e a desbravar a rica imensidão de sua fauna e flora.

Este foi o dia em que, mesmo com os olhos fechados, eu vi. Dei alguns passos para frente e adentrei pelo novo universo que a abertura da porta – ou melhor, a abertura do meu coração – havia me revelado. Pude perceber que o vento impetuoso e a luz forte que havia sentido poucos momentos antes vinham de um objeto longínquo de madeira encostado na parede. Ainda não sabia o que era...fui me aproximando devagar.

Ao chegar mais perto, pude ver uma escada bem alta, apoiada e amarrada numa parede. A escada reluzia fortemente e emitia um som parecido com correntes elétricas se chocando intensamente num campo magnético sem fim. Em cada degrau havia um número tingido em vermelho, em ordem crescente. E na parede sobre a qual a escada se apoiava estava escrito SHEOL.


Fascínio, dúvida, esperança, medo. Uma mistura extasiante de sentimentos se apoderou de mim. Não fazia a mínima idéia do que aquilo representava – se é que aquilo representava alguma coisa. Permaneci quieto, refletindo no que meu coração estava vendo.

Então, repentinamente, a mesma voz que havia me confortado anteriormente, exclamou mansamente:

- "VOCÊ NÃO ENTENDE O QUE VÊ, NÃO É MESMO? INFELIZMENTE A MINHA CRIAÇÃO SE ACOSTUMOU A ACREDITAR APENAS NAQUILO QUE PODE VER COM OS OLHOS OU TOCAR COM AS MÃOS... AOS POUCOS, VOCÊS SE ESQUECERAM QUE O CORAÇÃO É CAPAZ DE ENXERGAR COISAS INVÍSIVEIS AOS OLHOS, E DE OUVIR LINDAS SINFONIAS SILENCIOSAS AOS OUVIDOS. O QUE O SEU CORAÇÃO ESTÁ TENTANDO TE MOSTRAR É QUE ESTA ESCADA É A SUA VIDA. CADA DEGRAU REPRESENTA UM ANO DE VIDA QUE VOCÊ JÁ COMPLETOU”.

Atônito, não acreditei no que havia acabado de ouvir. Me aproximei ainda mais da escada e comecei a me deter em seus detalhes. Pude observar que em cada degrau estava gravada a minha impressão digital, juntamente com as decisões que havia tomado em cada ano da minha vida. Comecei a lê-las, e me recordei das muitas escolhas erradas que fiz ao longo da minha vida, e do quanto sofri por causa delas... Pude perceber o quanto eu ainda era escravo das minhas próprias escolhas do passado. Eu – que até então me julgava tão livre – vi o quanto era prisioneiro de mim mesmo. Chorei. Amargamente.

Soluços e lágrimas tomaram conta de mim. Simples palavras pareciam incapazes de sair da minha boca. Quase sem forças, como se sentisse que aquela voz também pudesse me ouvir, disse desfalecendo:

-
“MAS O QUE SIGNIFICA A PALAVRA QUE ESTÁ ESCRITA NA PAREDE?”
De repente, uma brisa suave veio em minha direção, transmitindo uma pesada mensagem na leve voz de Deus:

-
“SHEOL SIMBOLIZA A MORTE. VOCÊ CONSTRUIU SUA VIDA SOBRE UMA PAREDE QUE IRÁ TE CONDUZIR PARA A MORTE ETERNA. A VIDA NÃO É SÓ A ESCADA, MAS TAMBÉM O PROCESSO DE SUBIR ESSA ESCADA. POR TODOS ESSES ANOS VOCÊ TEM APOIADO SUA ESCADA SOBRE A PAREDE ERRADA. UMA SÓ VIDA A VIVER, E VOCÊ A PERDEU. ESTE É O DESTINO QUE VOCÊ DEU PARA SUA ALMA”.
- “NÃÃÃÃOOOO! NÃO PODE SER! SE EU TIVESSE APENAS MAIS UMA CHANCE...”, gritei ao léu, ouvindo o som do meu próprio eco se afastar e se perder várias vezes por aquele ambiente desconhecido. Enquanto gritava, eu mesmo me vi subitamente sugado por uma força extraordinária e lançado na escuridão eterna, onde só podia ouvir dor, aflição, lágrimas e o brado desesperado de milhões de almas.

Por um momento, cheguei a pensar que aquilo tudo não passara de um sonho, de uma pegadinha que o meu cérebro tramara contra mim. Porque, na vida real, essas coisas não acontecem. No mundo dos fatos, tudo é muito certo, muito lógico, muito racional. Mas aquela noite não foi assim.

Naquela noite em que eu não acordei mais, aprendi que eu não podia mais confiar apenas no que meus olhos viam. Descobri que os nossos olhos muitas vezes nos traem, porque eles nos levam a acreditar que somente aquilo que somos capazes de enxergar existe. MENTIRA! Me decepcionei comigo mesmo. Como podia um órgão do meu próprio corpo me trair a tal ponto?

Ironia ou não, justamente os órgãos que têm por função me fazer enxergar a realidade resolveram me iludir. Meus olhos mentiram pra mim. Descobri que os olhos nos mostram apenas a parte da realidade que eles conseguem captar; mas só o coração é capaz de nos revelar coisas que os nossos olhos não podem ver. Sim, os olhos do ser humano são míopes para as questões espirituais. Nessa área, quem enxerga é o coração.

Durante toda minha vida, meus olhos me traíram. E quem tentou me salvar foi meu coração, porque ele me mostrou coisas muito mais além do que minha vista era capaz de alcançar...
só que quando eu vi, era tarde demais.


Por Fernando Khoury

 
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